Jogando Amarelinha

Jogando Amarelinha

Se amor fosse por afinidades, estaríamos resolvidos.

Se amor fosse por semelhanças, estaríamos tranquilos.

Se amor fosse por amizade, estaríamos calmos.

Mas amor não é feito de razão, não é uma decisão, não é uma escolha consciente.

Amor é um tormento, um redemoinho de pássaros, uma inquietação espantosa.

Não há como estabelecer: vou amá-lo, vou amá-la, apesar de ser a pessoa ideal para estar conosco.

As pessoas ideais jamais são amadas. Elas são desejadas, mas não amadas. Elas são admiradas, mas não amadas.

Não há como se convencer de que se gosta de alguém, infelizmente, assim seria mais fácil.

Ama-se quem a gente menos espera, quem mais nos surpreende, quem mais nos irrita, quem mais nos desafia.

O amor é do contra, o amor é oposição, o amor é uma insegurança atenta.

Amor é a primeira vista ou não é amor – paga-se com a vida antecipadamente. Não é parcelado, não é um costume agradável.

O amor não vem com o tempo, fecha o tempo.

Pode se apaixonar, pode ter arrebatamentos, atração, gana de ficar, mas amor mesmo é fulminante desde o início e sempre.

Não é uma negociação, não é uma definição pelo melhor. É uma imposição química, emocional, seja como for.

Amor não é dote, não é indicação de pais e amigos, não é perfil equilibrado. É um erro inspirado. Aquele que erra ao amar acerta o amor.

Por isso, é tão difícil amar. Por isso, é tão difícil deixar de amar.

Amor não é caminhar na chuva, é ser sorteado pelo relâmpago.

Talvez encontre alguém que adore conversar, adore transar, adore estar junto, mas não significa que amará. Os dias felizes serão agradáveis, os dias tristes serão agradáveis, mas não será suficiente. Faltará aquela intensidade explosiva.

Com o amor, talvez brigue na hora de conversar, na hora de transar, na hora de estar junto, só que se enxergará inteiro como nunca, porque tudo faz sentido na falta de sentido, tudo é o dobro de ardor. Os dias felizes serão os mais felizes, os dias tristes serão os mais tristes. Não terá a mornidão, a neutralidade, o purgatório.

Amor é extremo: céu ou inferno. O jogo da amarelinha é feito de pedras, não de flores.

Amor é contundência implacável, não é adiamento e concordâncias.

Ou você acredita no amor ou confia no amor. São duas posturas distintas.

Quem acredita no amor não ama, tem vontade de amar, faz uma volta ao mundo para se convencer que está amando, é capaz de fingir ou mentir para si que está amando. No fundo, sabe que está sozinho, que vive racionalmente, que tem o domínio da situação, que tem condições de sair da relação a qualquer momento e não sofrerá absolutamente nada. Acreditar no amor é forçar o amor. Inventar o amor. Forjar o amor.

Já confiar no amor é quando não temos mais controle sobre o próprio sentimento: a mera possibilidade de uma separação é devastação. Confiar no amor é aceitar o amor. Obedecer ao amor. Sofrer com o amor.

Quem acredita no amor vive se explicando. Quem confia não precisa nem de explicação: o amor é uma realidade incontornável.

Fabrício Carpinejar

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