O jardim dos beija-flores

Bem próximo à janela da sala de reunião, belas rosas se instalavam, embelezando a fria construção de cimento. Todos os dias pela manhã, os beija-flores buscavam, nas entranhas das flores, o seu alimento, propiciando uma visão magnífica. E, do lado de dentro da sala, enquanto os beija-flores se deleitavam, decisões eram tomadas.

Os pássaros do lado de fora combinavam perfeitamente com a beleza das plantas e os homens, do lado de dentro, combinavam com a frieza do prédio. Enquanto os beija-flores buscavam o néctar das rosas para poderem viver, os homens buscavam outro néctar, mas o queriam em proporção bem maior.

Tudo dentro da multinacional girava em torno desse néctar. E, ao contrário dos pássaros, ele parecia fazer mal aos homens, porque nunca os satisfazia.

Mecanicamente, trabalhava-se. O ambiente pesado que podia se sentir ao percorrer os corredores daquela firma era, nada mais, nada menos, que as manifestações do sofrimento de muitas pessoas, que padeciam de uma mentalidade doente e ultrapassada.

O toque dos funcionários nos teclados dos computadores eram infelizes e soavam como as notas de um pianista que toca a sua última ária. Isso porque o expediente de trabalho era uma morte. Uma morte temporária que acontecia enquanto os funcionários permanecessem naquele ambiente. Então, eles deixavam de viver oito horas por dia, para depois disso, ressuscitar novamente.

As constantes ameaças de demissão e a desconfiança eram barreiras indestrutíveis, e o tratamento impessoal tirava qualquer chance de um maior envolvimento emocional. A tudo isso era atribuída a palavra “profissionalismo”.

“Profissional”, como o caso de Jonas, o funcionário 97, há trinta anos nesse estado transitório entre a vida e a morte.

Um dia, um beija-flor invadiu a sala de reuniões.

Como tal coisa pode ocorrer nessa tão conceituada empresa !? A alegria do lindo pássaro incomodava os altos executivos, que mandaram o faxineiro cortar as flores de perto da janela. E mais uma vez, o funcionário 97 fez o que não queria. Os beija-flores nunca voltaram, mas o único que notou aquilo foi o velho faxineiro, porque todos nunca tinham prestado atenção no show que a natureza apresentava dia a dia.

E, enquanto o teclar frenético soa e os espíritos clamam por socorro, a alta diretoria continua cortando os ramos de flores que crescem no âmago dos homens.

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